sexta-feira, 11 de dezembro de 2009

Os donos da história ou o storytelling dos outros




Venho há algum tempo pensando a quem pertencem os dados das pesquisas que recolhemos nas pesquisas sociais. Suamos, espreitamos, entrevistamos e depois?

Vejo sempre muito alarde em relação aos bancos de sêmen, células tronco, produtos que coloquem em risco a vida. Mas discursos, idéias, práticas sociais, ninguém nem se abala em proteger.

Hoje vieram me pedir autorização de cessão para "Deus e todo mundo" de uma fala que proferi em evento científico público.
Então pensei: - se falei em público, é publico.
Mas depois matutei:  - Se já falei e foi assim, tão público, porque tenho que autorizar a privatização da minha fala para se fazer sabe o que lá? .

Vou também hoje à noite para o lançamento de um livro no qual sou sujeito-objeto, ou melhor, objeto-sujeito. Dei um depoimento sobre as minhas memórias no reino acadêmico, tipo: penúrias, lágrimas e lerês.
Fui convidada, afinal não organizo a obra, mas minha história integra a obra, ou seja, se não tivesse depoimento não tinha obra nem organização, não é mesmo?
Acho que agora a história já não é mais minha porque foi tratada, organizada e editada em livro com capa e ISBN.
Fiquei querendo convidar "Deus e todo mundo" para comemorar comigo a difusão de uma história do qual muito me orgulha. Na dúvida, convidei porque adoro festa.
Pode ser até que eu esteja enganada, mas fiquei sem o menor conforto no enquadramento do meu storytelling.
Ser sujeito da pesquisa em tempos globais não tem o muito glamour e dá medo também!
Também virou hábito as pessoas virem conversar com você munidos de um MP treco ou gravador. Desculpa recorrente: ou eu presto atenção à sua fala ou eu escrevo. Nunca mais te devolvem na forma de transcrição ou de áudio ou vídeo a sua fala aprisionada nos instrumentos intrusivos modernos. Que o digam os maus políticos da turma do Arruda que nem podem agradecer impunes à Deus ao dinheiro recebido da propina. Com certeza vai sair no Youtube e vai nutrir o falatório paralisante da militância de bavardage (ótima terapia, mas...).
O susto maior é quando tu vês o sua fala enquadrada e apropriadamente incorporada ao discurso privatizado do outro. Dá um desânimo o fato de não podermos nem mesmo pensar alto.
Dá medo só de pensar que a ciência 2.0 vai se edificando em tromperies e apropriações indébitas.
Como gosto do meu cachorro!

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